Estudantes da Licenciatura Intercultural Indígena do Sul da Mata Atlântica (LII), fizeram uma intervenção na Reitoria da UFSC, no dia 14/11, exigindo o cumprimento das demandas de sua greve, realizada entre fevereiro e março deste ano. Os estudantes fizeram sua intervenção na Reitoria e permaneceram presentes no espaço até que fossem recebidos pelo Reitor para ler a sua carta de reivindicações. Os alunos do curso se mantêm em constantes mobilizações para que seus direitos básicos de permanência sejam garantidos, desde a formação da primeira turma da Licenciatura, em 2011. No documento de exigências se lê:
“Nós, os estudantes indígenas da Licenciatura Intercultural Indígena do Sul e Sudeste da Mata Atlântica da Universidade Federal de Santa Catarina, viemos por meio deste informar que exigimos um posicionamento formal desta reitoria para resolver todos os problemas que nos atingem.
Estamos há quatro anos nesta universidade e os problemas se agravaram, mesmo após procurar a coordenação de nosso curso em repetidas oportunidades, além de mais de uma visita nesta reitoria, na PRAE não enxergamos qualquer resposta ou encaminhamento mínimo para o que apontamos desde o primeiro ano de curso. Nos últimos dias acionamos novamente as nossas lideranças tradicionais, além da FUNAI, SESAI, MPI e do MPF para denunciar as condições de nosso alojamento e o modo como somos maltratados e violentados diariamente nesta universidade.
Estamos com dois estudantes recentemente hospitalizados, em uma situação que foi informada por escrito que iria acontecer para a reitoria se ela não se posicionasse e resolvesse a questão. Informamos a reitoria na primeira semana de maio, se passaram seis meses desde a entrega da denúncia e nem a reitoria, nem a ouvidoria e nem a SESAI se deram ao trabalho de nos ouvir. Não afastou, nem mesmo preventivamente, nenhuma das nossas agressoras.
A reitoria da UFSC está zombando de nós indígenas desde quando chegamos neste campus pela primeira vez, enquanto defende há anos racistas e sequestradoras de bolsas de permanência de estudantes indígenas. Após reclamarmos da contratação de professores que não falam a própria língua, realizou-se um concurso com duas vagas, e novamente não incluiu o domínio de língua como pré-requisito, além de aumentar o nível de formação exigido e novamente ignorar o nosso direito à consulta livre, prévia e informada.
Neste sentido, exigimos que a reitoria resolva as seguintes questões imediatamente, sob o risco de tomarmos a reitoria até que a situação seja resolvida. As principais questões são as seguintes:
- Regularizar a situação do módulo redondo, passando ele como construção destinada exclusivamente para uso da licenciatura indígena e em caráter irreversível.
- Concluir as reformas dos dois banheiros do módulo 3 da moradia estudantil.
- Garantir independência e autonomia de acesso físico e gestão ao módulo do centro acadêmico indígena, independente do dia ou horário.
- Determinar o fim dos assédios e das coações por parte da coordenação de curso contra os estudantes.
- Validação das disciplinas dos estudantes que foram convidados para completar nossas turmas no meio do curso.
- Agendar reuniões periódicas entre a reitoria e a licenciatura para verificar o andamento destas demandas.
- Promover um plano de permanência para os estudantes das futuras turmas, que inclua alojamento adequado, alimentação que respeite as nossas culturas e bolsas que não serão suspensas para nos pressionar.
- Garantir o respeito à consulta livre, prévia e informada em TODOS os processos internos da UFSC, em todas as ações que nos atingem, como por exemplo na construção de políticas indígenas (o GT não respeitou a consulta livre, prévia e informada), na contratação de professores substitutos e permanentes e na escolha dos TAEs, coordenadores, estagiários e outros profissionais, assim como no calendário do curso. Sobre os últimos três concursos é especialmente grave a situação referente a exigência de um nível de formação exigido, enquanto ignora a necessidade de proficiência da língua materna, realiza provas em Florianópolis e cobra centenas de reais numa inscrição.”
Também é exigido que sejam removidas de seus cargos algumas servidoras da LII que perseguiram os estudantes após suas mobilizações e que servem como representantes políticas da burocracia universitária dentro do curso, impossibilitando que os cargos de docência sejam preenchidos por indígenas e que as aulas sejam ministradas nas línguas maternas dos alunos.
Os estudantes da LII exigem, finalmente, a construção de um novo alojamento, que contemple suas necessidades e respeite as especificidades culturais de cada povo e que suas demandas sejam respeitadas pela instituição, que reiteradamente os perseguiu e ameaçou com cortes de bolsas. Como continuação de sua luta, os alunos agora buscam conformar o Centro Acadêmico de seu curso.
Histórico de Lutas
Criado em 2011, o curso possui uma proposta inovadora e bastante significativa para os povos indígenas da região, segundo o PPC do curso:
“A LII visa habilitar numa perspectiva intercultural e interdisciplinar direcionada aos anos finais do Ensino Fundamental e ao Ensino Médio de escolas indígenas, possibilitando igualmente o desenvolvimento de atividades para além da esfera escolar, com atuação em projetos, pesquisas e atividades ligadas diretamente às suas comunidades.”.
Infelizmente, a Licenciatura sofre com diversos problemas, que vão desde a alocação de recursos para sua realização até sua coordenação, que por diversas vezes busca retirar a autonomia da pesquisa dos estudantes do curso. Alternando entre momentos na Universidade e momentos nas aldeias, é na integração dos alunos ao espaço universitário e na sua permanência no mesmo que os problemas aparecem.
A LII possui um longo histórico de mobilizações para a conquista de direitos estudantis, como o próprio alojamento cuja reforma é agora exigida. Antes da alocação dos estudantes no espaço, diferentes pousadas eram utilizadas como moradia pela UFSC, que enchia quartos pequenos com diversos estudantes. As diferentes greves e Ocupações garantiram a alocação dos estudantes para alguns locais provisórios, até que um alojamento adequado fosse construído, novamente de acordo com o PPC do curso:
“De 2011 a 2016, a sua estadia durante o Tempo Universidade (TU) foi em hotéis, com recursos PROLIND e UFSC. A partir de 2017, foram disponibilizados para os/as estudantes da segunda turma da LII os seguintes espaços para alojamento: o antigo prédio do Grêmio da Prefeitura Universitária da UFSC, espaço para 30 pessoas em sala única (com divisórias) com beliches, disponibilidade de banheiros e chuveiros; antigo prédio do Departamento de Segurança (DESEG), junto à Prefeitura Universitária da UFSC, sendo um espaço para 10 pessoas em quartos separados, com dois sanitários com chuveiros. De acordo com as orientações recebidas pelo engenheiro Paulo Roberto Pinto da Luz, Secretário de Obras, Manutenção e Ambiente (SEOMA/UFSC), a coordenação da LII requereu à Direção do CFH a apresentação, via SPA, de solicitação de reforma para a melhoria e adequação dos dois locais de alojamento dos acadêmicos do Curso […], visando o ingresso de nova turma a partir de 2021/1, com capacidade para 45 acadêmicos, conforme apresentado em relatório do GT LII entregue ao Gabinete da Reitoria em 11 de março de 2020.” (Projeto Pedagógico de Curso, 2020, p. 198-199).
O atual alojamento, onde os estudantes exigem as reformas é o “antigo prédio do Grêmio da Prefeitura Universitária da UFSC”, que por conta do espaço minúsculo reservado para os estudantes, se torna um ambiente extremamente quente, com ventiladores de teto queimados e buracos no teto, o que torna a estadia no local extremamente difícil, cuja necessidade de reforma é reconhecida pela própria coordenação do curso há pelo menos 5 anos.
A Mobilização Estudantil se Intensifica
As disputas políticas internas no curso vem se intensificando, diferentes tentativas ocorrem para manter um número maior de professores não-indígenas do que indígenas, tudo visando conter o avanço das demandas dos indígenas, sejam estudantes ou professores e manter a atual política de tutela realizada pela coordenação do curso.
Essa crescente disputa política é uma resposta à uma também crescente mobilização estudantil, que mesmo já existindo desde a primeira turma nunca unificou tanto os estudantes, de forma tão organizada em prol da autonomia estudantil. Diversos direitos só foram garantidos mediante greves estudantis, como o direito à creche para os filhos e filhas dos estudantes ou a entrega de alimentos in natura para a refeição dos alunos.
Toda esta mobilização garantiu conquistas parciais. A situação tensa e ainda não resolvida do Alojamento levou ao último movimento de Greve de Ocupação, um dos mais expressivos, obtendo o apoio de estudantes não-indígenas de outros cursos e, como resultado das demandas estudantis, o auto afastamento da então coordenadora. Agora, os estudantes cobram para que todas as suas demandas sejam cumpridas, se organizando enquanto curso, com a devida representação de cada povo para garantir a construção de seu alojamento e as devidas condições de permanência para os próximos estudantes que virão!
VIVA A LUTA DOS ESTUDANTES INDÍGENAS!
VIVA OS POVOS GUARANI, KAINGANG E LAKLÃNÕ-XOKLENG!
VIVA O MOVIMENTO ESTUDANTIL INDEPENDENTE E COMBATIVO!
REBELAR-SE É JUSTO!








