Nota contra falsa regulamentação da profissão do pedagogo
Em abril de 2023 voltou a tramitar na comissão de educação da câmara dos deputados o projeto de lei da falsa regulamentação da profissão do pedagogo. O PL 1.735/2019 de autoria de Mauro Nazif, do PSB de Rondônia, retira da lata do lixo o PL 6.847/2017, de autoria de Goulart, PSD e reapresenta o seu conteúdo sem tirar nem por. O famigerado projeto visa estabelecer uma suposta regulamentação da profissão do pedagogo, que em última instância significa um ataque à carreira dos pedagogos ao ferir sua autonomia e liberdade de cátedra, vigiar e puni-los no exercício de sua profissão, coorporativizá-los, etc. Abaixo tecemos alguns comentários acerca do que representa o PL do ponto de vista da formação, do aprofundamento da via privatista para o curso e de qual o caminho para os pedagogos e demais trabalhadores da educação e pesquisadores da área para a defesa de uma formação unitária e científica. Para maior aprofundamento, recomendamos a leitura de nosso Boletim 003, de novembro de 2017, onde entramos mais a fundo nos pormenores do projeto e da discussão em torno da formação do pedagogo historicamente.
a) Falsa regulamentação e a fragmentação da profissão do pedagogo
O projeto, que versa sobre a regulamentação e atribuição da profissão do pedagogo, declara em seu art. 2º que os pedagogos seriam os “profissionais portadores de diploma de curso de graduação em pedagogia, para exercerem a docência, bem como atividades nas quais sejam exigidos conhecimentos pedagógicos”. (negrito nosso).
Já em seu art. 3º o projeto estabelece as atribuições do pedagogo. Dessa forma, o PL fragmenta a profissão do pedagogo, reduz seu campo de atuação ao não mencionar a atuação na educação infantil e nas séries iniciais do ensino fundamental e no curso Normal, nos magistérios. Com isso, o PL visa também dividir o campo dos trabalhadores em educação, retirando-os do quadro do magistério, incidindo em problemas no que diz respeito ao plano de carreira, piso salarial, representação sindical, numa tentativa de corporativizar e fragmentar a categoria dos trabalhadores em educação, fragilizando sua organização.
Nesse sentido, fica evidente a relação que tal projeto tem com os recentes ataques à formação docente expressos na BNCC e BNC-FP, uma vez que abre caminho para que sejam realizadas mudanças curriculares pretendidas pela resolução 02/2019, como por exemplo, a fragmentação da formação (tendo o aluno que escolher entre educação infantil, anos iniciais do ensino fundamental ou gestão escolar) e até mesmo a separação da licenciatura e bacharelado em dois cursos diversos, atentando contra a formação plena do pedagogo como docente, pesquisador e coordenador pedagógico, possibilitando, inclusive, que a gestão pedagógica seja exercida por profissionais com formação técnica, por meros administradores empresariais, e não por um profissional que domina os processos de ensino-aprendizagem, que tem formação solida no que diz respeito ao processo educativo como um todo, tanto em ambiente escolares como não escolares.
Portanto, nós da ExNEPe reafirmamos que do ponto de vista da formação, a divisão e fragmentação do curso significa um retrocesso no que diz respeito às discussões que tem sido travadas entre as entidades da área e defendemos, uma vez mais, a necessidade de avançar no debate em torno da luta pela garantia da formação unitária do pedagogo, que tome a docência, a pesquisa e a gestão como uma unidade indissociável e que tenha como fundamento o conceito marxista de totalidade, através da síntese das múltiplas determinações de uma formação científica e comprometida com a transformação da sociedade. Sendo assim, como temos apontado em nossas formulações, entendemos a Docência como ato político-pedagógico que compreende ações que tem como objetivo desenvolver a aprendizagem, através de um contínuo exercício de transformação da realidade, desenvolvendo nos alunos uma visão crítica da mesma. No que diz respeito à Pesquisa, esta deve ser parte obrigatória dos currículos de qualquer instituição de ensino superior. Além disso, o estudante deve participar de toda as etapas da pesquisa e não ser tratado apenas como “tarefeiro”. Ainda, as pesquisas não devem ter interesse mercadológico, em função dos monopólios estrangeiros ou nacionais e sim estar a serviço dos interesses do povo e da nação, partindo de temas elaborados em conjunto com a sociedade, indo de encontro de suas necessidades. Já a Gestão, deve ser construída de maneira democrática com toda comunidade escolar. As discussões e deliberações devem ser feitas coletivamente e a gestão e a instituição sujeita a constante avaliação da comunidade escolar, para que se aprimore cada vez mais a qualidade do trabalho. O pedagogo deve ocupar-se da coordenação político-pedagógica colegiada dos ambientes educativos e educacionais.
b) Falsa regulamentação e a entrega do curso aos privatistas
Quanto ao art. 4º do PL, fica estabelecido que caberá ao Poder Executivo criar Conselho Federal e Conselhos Regionais de Pedagogia, os quais ficariam responsáveis por estabelecer as atribuições dos pedagogos, seus deveres e direitos, jornada de trabalho, piso salarial, etc. Isso significa que ditos conselhos, criados e manuseados pelos canalhas que ocupam as cadeiras do executivo em nosso país, passariam a exercer uma dominação sobre o trabalho docente, seu plano de carreira, piso salarial, podendo inclusive, punir os pedagogos que não seguirem à risca seus ditames, perseguir àqueles que se mobilizarem na luta por melhores condições de trabalho, por exemplo. Basta uma simples olhada para as recentes politicas educacionais levada a cabo por ditos senhores do poder executivo para ter certeza que seus anseios são justamente entregar os conselhos, federal ou regionais, aos privatistas. Ora, quem está por trás dos recentes ataques a educação pública e gratuita em nosso país como, por exemplo, a BNCC, BNC e a reforma do “novo” ensino médio, senão os chamados tubarões da educação privada? Pois tirem a mão da pedagogia!
Cabe ressaltar que os conselhos teriam o direito de cobrar anuidade dos pedagogos para que estes estejam “regulamentados”. Sendo a pedagogia um dos cursos que mais formam anualmente, não é difícil perceber que os olhos dos senhores privatistas brilham com a possibilidade de lucrar milhões de reais às custas dos pedagogos. Ainda, tal proposta faria com que os pedagogos passassem a terem que pagar para poder trabalhar, uma vez que aquele que não estiver regulamentado não poderá exercer a profissão. Ou seja, diante de profunda crise econômica, política, social e moral pela qual se afunda o Brasil, tal projeto cairia como uma luva nos intentos de garantir lucro aos setores da educação privada, reaquecendo parte da economia, tentando a todo custo salvar-se da crise, ao passo que também entra no bojo dos projetos que tem como objetivo reestruturar e reorganizar o sistema de ensino brasileiro, aumentando a dominação político-ideológica de professores e estudantes, impondo uma concepção de ensino e de trabalho docente pautada no tecnicismo, no pragmatismo, recheado com empreendedorismo, individualismo extremo em detrimento de uma formação de solidez teórico-cientifica, crítica e a serviço do povo.
c) Barrar a falsa regulamentação da profissão do pedagogo
Diante disso, a ExNEPe reafirma seu repúdio ao PL 1.735 e conclama a todos os estudantes, professores, pesquisadores e demais interessados na defesa da educação publica e gratuita a novamente enterrar a falsa regulamentação da profissão do pedagogo. Em 2017 assim o fizemos com o PL 6.847. Foi justamente nossa combativa mobilização, a partir de encontros, fóruns e seminários, seguidos de manifestações radicalizadas por todo o país e uma vigorosa intervenção em audiência pública em Brasília que fez tremer de medo os privatistas e seus cupinchas. Não nos interessa a falsa regulamentação da profissão do pedagogo. Aos responsáveis por tal projeto criminoso afirmamos: se estão tão preocupados com nossa profissão, onde estão os projetos que visam a melhoria em nossas condições de trabalho; o aumento – e o cumprimento – de nosso piso salarial nacional; a abertura de concursos públicos; a garantia de uma formação unitária e científica? É isso que nós pedagogos queremos e não essa falsa regulamentação que destrói nossa profissão e entrega aos privatistas.
ABAIXO A FALSA REGULAMENTAÇÃO DA PROFISSÃO DO PEDAGOGO!